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    O turismo radioativo de Chernobyl

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    O turismo radioativo de Chernobyl

    Quem um belo dia acorda e pensa em ir a Chernobyl? Bom, eu! Uma coisa que sempre me fascinou foi a história por trás do acidente na Usina de Chernobyl na então União Soviética, uma oportunidade apareceu e quando me dei conta já tinha comprado minhas passagens e para Kiev na Ucrânia.

    Confesso que na excitação da compra da passagem e do tour nada de perigo me passou pela cabeça, mas alguns dias que antecediam a viagem eu fiquem bem neurótico com o lance da radiação. Alguns comentários na internet diziam que só um louco visitaria Chernobyl por turismo como outros diziam que não tinha problema. Enfim, decidi encarar.

    Aqui vai um guia completo para visitar Chernobyl.

    Chernobyl e a Usina de Chernobyl

    Primeiro precisamos saber que a cidade de Chernobyl é diferente da Usina de Chernobyl, que por sua vez não está localizado nessa cidade.

    A cidade de Chernobyl já existia muito antes da existência da Usina nuclear, que foi construída apenas em meados de 1970 pela antiga União Soviética e há 18km de Chernobyl. Ao contrário do que muitos pensam, a cidade de Chernobyl não abrigava os trabalhadores da usina, para isso foi planejada uma outra cidade chamada de Pripyat que ficava ao lado da Usina Nuclear.

    A Usina Nuclear de Chernobyl era uma estação composta por 4 reatores nucleares além de mais 2 reatores adicionais que não chegaram a ser finalizados. Tudo estava localizado no norte da Ucrânia, há 16km da fronteira com a Bielorrússia e 110km da capital da Ucrânia, Kiev. Ela era capaz de produzir 1 gigawatt de energia elétrica, que em conjunto de todos os reatores conseguiam suprir mais de 10% de toda a Ucrânia.

    O Acidente de Chernobyl

    O dia 26 de Abril de 1986 tecnicos da Usina de Chernobyl decidiram fazer alguns testes no reator de número 4 em Chernobyl conhecido como chernobyl-4. O teste tinha como objetivo verificar o funcionamento da usina com baixa energia e para isso era preciso desligar a circulação da água que resfriava o reator nuclear, o que não foi uma boa ideia. O reator explodiu e elementos químicos como Plutônio, Urânio, Iodo 131 e Césio 137 se espalharam pelo ar há mais de 1km de altura, como uma nuvem radioativa.

    Algumas das pessoas que trabalhavam no momento e foram até o reator verificar o acidente foram fulminadas instantaneamente pela radiação e morreram. O reator queimou por mais de 10 dias. Dos trabalhadores no local, mais de 130 sofreram a síndrome aguda da radiação, quando o corpo recebe doses altas, dessas 28 morreram na hora, 30 ao longo dos anos e mais de 70 continuam vivos, porém carregam consequências graves.

    Chernobyl

    Reator 4 após a explosão

    O governo sabia do ocorrido, porém escondeu o acidente, que foi revelado a população de Chernobyl e Pripyat apenas 38 horas após a explosão e depois que outros países como Finlândia e Suécia detectaram a nuvem radioativa no seu espaço aéreo e pressionaram a União Soviética, porém já era tarde demais.

    As mais de 50 mil pessoas que vivam em Pripyat foram evacuadas as pressas em ônibus super lotados e sem muitas informações e todo o resto que viviam em um raio de até 30km da Usina tiveram que abandonar seu lares, esse raio ficou conhecido como Zona de Exclusão de Chernobyl.

    Como visitar a Zona de Exclusão de Chernobyl?

    Ir a Chernobyl não é um passeio como outro qualquer, é preciso muita autorização e papelada para passar pelas barreiras e acessar a zona de exclusão que fica há mais de 130km da capital Kiev. Atualmente a única maneira de chegar a Chernobyl é com agencias de turismo autorizadas no qual você deve reservar e enviar toda a documentação necessária com semanas de antecedência para que todos os tramites sejam feitos a tempo. Uma das empresas que fazem esse passeio é a Solo East Travel.

    Fechando o tour para Chernobyl com a Solo East Tour

    Eu comecei a pesquisar sobre como ir a Chernobyl uns 2 meses de antecedência e fechei com a empresa com 1 mês de antecedência. A empresa que mais me agradou foi a Solo East Travel que tem sede em Kiev. Vi diversos relatos de pessoas que foram com eles e não se decepcionaram então resolvi fechar com eles também.

    No site deles você pode encontrar todo o itinerário do passeio de 1 dia, além do passeio de 2 dias por Chernobyl no qual você dorme no lugar. O que eu escolhi foi o de 1 dia que incluía um seguro pessoal, transporte, almoço, entrada na zona de exclusão e o passeio guiado. A Solo East Tour também faz diversos outros passeios como para Bases Militares e treino em tiro com AK47.

    Existem diversas outras empresas com valores até mais baixos para Chernobyl, mas quando se trata de uma área altamente perigosa, pagar barato pode sair caro no final.

    Quando eu fechei o tour com a Solo East Travel eles me pediram para enviar alguns documentos e dados pessoais com pelo menos 2 semanas de antecedência para que todos os tramites nos check points fossem resolvidos e que eu não tivesse problemas para entrar na zona de exclusão. Com tudo finalizado eles te mandam um e-mail com as informações do ponto de encontro.

    Para saber mais basta acessar o site deles clicando aqui.

    Qualquer pessoa pode visitar Chernobyl?

    Bom, na prática sim. As empresas fornecem acesso para portadores com necessidades especiais, mas vale ter em mente que o acesso ao local é difícil devido a vegetação, então um cadeirante por exemplo pode não ter muito conforto no momento.

    Mulheres grávidas não são aconselhadas a ir, especialmente se já estiver no 7 mês de gestação.

    O que levar para Chernobyl

    Primeiro é indispensável que você use uma bota resistente, calças compridas para trilha ou até mesmo jeans e blusa com manga comprida. Quanto mais você puder cobrir o seu corpo melhor será, até mesmo no verão com seus 31 graus.

    Se for no inverno é recomendável roupas quentes, já se for no verão leve um protetor solar e um repelente de insetos.

    Leve o seu passaporte, nunca CNH ou identidade, sempre o passaporte.

    Leve água o suficiente para um dia de passeio e alguns snacks para enganar a fome.

    O que pode ou não fazer em Chernobyl

    Primeiro de tudo é altamente proibido tocar em qualquer objeto, parede ou plantas da área, e mais proibido ainda tentar levar para casa qualquer objeto.

    Pode levar comida, tem até uma parada para almoço em um restaurante em Chernobyl (onde tem uma comida deliciosa e descontaminada), mas ao levar comida é recomendado que você coma dentro da van, nunca nas trilhas ou nas áreas de radiação.

    Não pode tirar foto dos postos militares e nem dos militares e trabalhadores nas áreas de Chernobyl. Se for tirar, seja discreto (como eu).

    Sempre siga a guia, nunca saia do caminho indicado por ela. Os guias sabem de cabeça os lugares com baixa e alta radiação, eles nos levam apenas nos caminhos seguros, caso você saia do caminho ou entre em algum prédio que seja proibido entrar, pode se contaminar.

    Nunca toque o solo diretamente, ele é uma das coisas mais contaminadas em todo lugar.

    A caminho de Chernobyl

    No dia do passeio eu fui no local e hora marcada pela Solo East Travel, a van saí da Independence Square (Praça da Independência) em Kiev as 8:15 da manhã, porém é preciso estar lá uns 15 minutos antes para checar todos os documentos. A van parte do centro de Kiev, mas antes faz uma parada em um posto de Gasolina para banheiro e comprar alguns snacks.

    Dentro da van a guia nos oferece um Contador Geiger para quem quiser alugar. Esse aparelho tem a capacidade de medir a radiação ao redor. O normal é que esteja entre 0.15 a 0.30, mas conforme vamos avançando os números aumentam.

    Dali são mais algumas horas até o primeiro posto de controle antes de entrarmos na Zona de Exclusão. Neste posto todos da van tiveram que descer e apresentar os passaportes junto com a papelada da agência, os militares checam 1 por 1 e depois liberam a passagem.

    Logo na primeira parada fomos a vila fantasma de Zalissia que foi abandonadas as pressas. Da pra sentir a tensão no ar deixada pelas milhares de vidas interrompidas ali. Casas, carros, objetos, tudo deixado para trás há mais de 30 anos.

    Em uma das construções perto dali temos uma escolinha infantil, onde ainda é possível ver os brinquedos, sapatos e camas das crianças, além de bilhetes e cartinhas escritas por elas e deixadas no mural.

    Nessa altura o contador que marcava 0.15 dispara para entre 1.5 a 2.5, em alguns momentos ele tem picos de 6.0 e começa a fazer um barulho de alerta agoniante. Quando aproximamos o contador para perto do solo ele dispara para 24.5, centena de vezes maior do que o normal.

    O solo é o mais contaminado de todos, especialmente porque na época as pessoas começaram a lavar os prédios com água e sabão com a esperança de que a radiação desaparecesse, mas o que aconteceu foi que a água a levou para o solo.

    Após essa parada seguimos em frente, e após mais um check point para verificar nossos passaportes nós adentramos a cidade de Chernobyl. A cidade é um grande mix de edifícios e casas abandonadas com a mesma quantidade em habitadas, tem até um hotel e restaurante lá.

    Isso acontece porque muitas pessoas ainda moram em Chernobyl, especialmente aqueles que trabalham na Usina, porém eles podem ficar até 15 dias lá, depois precisam ficar mais 15 fora até retornarem, esse rodizio serve para que não fiquem expostos muito tempo a radiação.

    Ali nós conhecemos um memorial de um anjo todo feito em metal, de frente para esse memorial está um corredor com várias placas, cada uma contendo o nome de uma vila que precisou ser abandonada. Ao todo são mais de 100 vilas. Ao lado do memorial temos um pequeno museu que conta um pouco mais, através de fotos e vídeos, um pouco da história do acidente da Usina de Chernobyl.

    Em seguida visitamos um outro memorial em homenagem aos 4 bombeiros e 3 trabalhadores que pagaram com suas vidas ao tentares apagar o incêndio causado pela explosão do reator. Na plaquinha a seguinte mensagem: “Dedicado aqueles que salvaram o mundo”. Perto dali, cercado por uma grade estão expostos o maquinário que há mais de 30 anos atrás foram usados para limpar o entulho deixado pela explosão. Todos ficaram contaminados.

    Alguns minutos depois partimos para o reator 4. No caminho já é possível ver as instalações da usina, além dos reatores 5 e 6 que nunca chegaram a ser concluídos. De longe e à beira de um canal cheio de peixes (provavelmente todos contaminados) já era possível ver o reator 4 coberto pelo novo sarcófago, pois esse é o nome dado a construção de metal e concreto que impede a radiação de sair.

    O primeiro sarcófago teve uma vida útil de 15 anos, o mesmo acontecerá com este segundo, que após o prazo que agora é de 100 anos precisará ser coberto por algo maior.

    Pripyat: A cidade fantasma

    Dali nós seguimos para Pripyat, a cidade no qual as pessoas que trabalhavam na usina moravam na época. No caminho passamos por um pedacinho da chamada Floresta Vermelha, pois foi como muitas das plantas ficaram após contaminadas pela radiação. A entrada na floresta é extremamente proibida, pois lá, presa entre as árvores é onde está uma das maiores concentrações da nuvem radioativa. Quando passamos de carro, na estrada os nossos contadores geiger subiram de 0.80 para 12.0 de uma vez e segundo a guia, lá no meio da floresta ele registra cerca de 200.0.

    Chegamos em Pripyat e logo aquele choque. Uma cidade como qualquer outra, com prédios altos, praças, parques, porém completamente abandonada, tomada pela vegetação. Conforme andávamos víamos os prédios locais como a prefeitura, hospital, supermercado e até um ginásio de esportes abandonado. O nível de radiação na cidade variava entre 1.2 e 2.4.

    Andando um pouco mais chegamos há um parque de diversões abandonado, que é um dos símbolos da cidade. ele nunca chegou a ser usado, nem se quer inaugurado. Perto dali temos o centro esportivo da cidade, com uma quadra de basquete e até uma piscina. Tudo completamente abandonado.

    Ao lado visitamos aquilo que era uma escola infantil. Não dá pra desbravar muito do prédio, pois é proibido entrar neles, porém conseguimos acessar a cozinha da escola. Lá ainda é possível ver os fogões e equipamentos de cozinha, além de uma centena de máscaras de gás espalhadas pelo chão. A próxima parada era no porto de Pripyat, onde estava uma das maiores concentrações de radiação de todo o passeio. Quando chegávamos o aparelho para perto do solo ele disparava para inacreditáveis 60.0.

    Duga-3

    Após sair de Pripyat nós fomos ver um lugar não menos importante, mas um tanto que interessante, esse lugar se chama Duga-3.
    Basicamente na época da União Soviética foi construído uma grande antena com objetivos misteriosos. Essa antena emitia ondas de som agudas de 10Hz que puderam ser ouvidas entre 1976 e 1989 e parecia muito com o som de um Pica-Pau, tanto que foi apelidado de Pica-Pau Russo.

    A freqüência utilizada e suas variações geravam interrupções em emissoras legais, estações de rádio amador e comunicações da aviação comercial, resultando em milhares de queixas de vários países do mundo. Ninguém sabia de onde vinha, pois a localização da torre era extremamente escondida.

    Na época ninguém sabia ao certo o que era e muitas teorias foram especuladas, como uma antena que emitia ondas de controle mental ou de interferência no clima. O fato é que com a queda da União Soviética foi assumido publicamente que o Duga-3 se tratava de um radar de inteligencia militar. De fato a construção é bizarra e dá medo.

    Fim do passeio. Peguei radiação?

    A menos que você tenha enfiado algo na boca ou tocado em algo que não devia, as chances de você se contaminar com radiação é mínima. Durante o passeio todo o que o nosso corpo absorve é menor do que a quantidade emitida em um exame de Raio-X.

    De qualquer maneira no final do passeio nós temos que passar por 2 máquinas que detectam o nível de radiação no corpo. Em caso de contaminação a pessoa é mantida em quarentena até que esteja totalmente limpa. Ninguém no meu grupo ficou, então não sei dizer como seria, mas ouvi dizer que a pessoa é encaminhada para um hospital em Kiev.

    Eu não sei descrever ao certo a sensação de estar em um lugar que foi palco de um acidente que entrou pra história da humanidade. Em determinados pontos o clima é tão tenso que parecia ser possível cortar com uma faca.

    É perigoso? Sim, não posso dizer que não é, afinal a radiação é um mal invisível. Visitar Chernobyl e Pripyat é uma experiência única, é imergir na história estudada na escola de uma forma tão profunda que não há como explicar.

    Se eu recomendo.. bom, claro que recomendo, ainda mais para os amantes de história, química e biologia, mas é uma visita que precisa ser pensada, afinal, estamos falando de radiação.

    Solo East Tour
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    Olá! Meu nome é Leonardo, tenho 33 anos, sou de Brasília - DF, mas moro na Europa há mais de 8 anos. O desejo de viajar somou com uma frustração que aconteceu e me fez sair do Brasil. Eu amo viajar, conhecer lugares, pessoas e culturas, tanto que resolvi criar o blog Tô Longe de Casa para poder compartilhar com as pessoas todas essas minhas experiências pelo mundo.

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